quarta-feira, 27 de março de 2013

Sadismo na perspetiva de Sartre


Se aceitarmos que a relação sexual é, como todas as relações interpessoais, uma relação de conflito, na qual o Eu, embora precise do Outro para ser confirmado na sua identidade, também o procura objetificar para não ser ele próprio objetificado, percebemos facilmente a estratégia sexual do  sádico.

Cada ser humano é corpo e consciência, “ser em si” e  “ser para si”, na terminologia sartriana. O corpo pode ser facilmente dominado, mas a consciência resiste à dominação e aquele que pretende dominar não se consegue dar por satisfeito. Ele quer também vergar aquela consciência qe se rebela.

Temos então que o sádico não quer apenas apropriar-se do corpo, quer também dominar a consciência que habita esse corpo; mas a consciência só poderá ser dominada se ela própria for reduzida ao corpo - o que acontece quando o corpo experimenta dor e sofrimento intenso; nesse caso, dor e sofrimento impõem-se de tal maneira que “a faticidade invade a consciência” e esta, enquanto consciência reflexiva, é anulada.

O que isto significa é que aquele que sofre não consegue pensar em mais nada senão no sofrimento físico ou psíquico que lhe está a ser inflingido; esse sofrimento absorve de tal maneira a sua atenção que a sua capacidade reflexiva desaparece e com ela a possibilidade de se afirmar perante o outro que, aparentemente, sai vitorioso; e dizemos aparentemente, porque o que ele queria era apropriar-se da consciência do outro, mas a estratégia usada levou à destruição do “bem” perseguido com tanto afinco.

Por tudo isto, deve entender-se o sadismo como a consequência necessária de uma percepção das relações sexuais como relações de domínio/submissão, que numa forma mais ou menos mitigada é a que se encontra presente no ainda atual paradigma sexual.

terça-feira, 19 de março de 2013

O Feminismo continua a fazer todo o sentido

“Em certos círculos, nas maiores cidades do mundo, o feminismo andava meio fora de moda. Acusavam-no de ter envelhecido e se tornado irrelevante. Achava-se que a igualdade entre homens e mulheres já era dado da realidade e não mereceria mais apoio político específico.

A menção ao conceito evocava o estereótipo da mulher raivosa queimando sutiã na rua. As feministas militantes eram tratadas com desprezo e condescendência ("ai meu Deus, lá vem aquela chata de novo...").

Não é de se estranhar que, na Inglaterra, no ano passado, apenas 8% das mulheres entre 20 e 24 anos se considerassem feministas.

O feminismo a que me refiro consiste em uma ampla coleção de ideologias, de variadas vertentes, cada uma com visões e estratégias próprias. No entanto, por mais diversas que possam ser, todas essas ideologias feministas se articulam a partir da noção comum de que a desigualdade entre homens e mulheres é inaceitável e deve ser combatida.

Ainda que, em termos globais, a condição relativa das mulheres tenha evoluído substancialmente nos últimos 50 anos, a desigualdade entre os sexos continua a se manifestar tanto em termos de direitos abstratos quanto em termos muito concretos de violência e ameaça física.

De acordo com a ONU, uma em cada três mulheres será vítima de estupro ou espancamento ao longo da vida. Em alguns países, essa proporção chega a sete em cada dez. Nos Estados Unidos, por exemplo, três mulheres são assassinadas todos os dias por seus parceiros. E nunca é demais lembrar que, enquanto você lê esta coluna, há meninas sendo trocadas por carneiros no Afeganistão.

Para essas mulheres, o exercício do feminismo não é uma questão de moda. É uma estratégia de sobrevivência. Não é um feminismo de universidade.

É um feminismo de necessidade, que deixa nítidas a importância e a atualidade da luta das mulheres contra o abuso físico, moral e legal que sofrem cotidianamente.

Negar a relevância dessa luta reflete irresponsabilidade social e falta de solidariedade humana. A violência contra as mulheres é injustificável. Aceitá-la com naturalidade é criminoso. É agredir por omissão.

Desde que uma estudante indiana foi brutalizada e morta por um grupo de homens em Nova Déli, em dezembro passado, manifestações feministas começaram a pulular ao redor do planeta. Como em um mecanismo de contágio, mulheres saíram às ruas no Egito, no Paquistão e na Ucrânia para exigir maior proteção legal e a ampliação de seus direitos.

Na quinta-feira passada, 14 de fevereiro, eventos pelo fim da violência contra a mulher tiveram lugar em 190 países. A igualdade de gênero não é um dado da realidade humana, e sim um privilégio raro, que a maioria das mulheres do mundo só conquistará por meio da mobilização política.

Essas mulheres e seus aliados defendem uma causa justa e precisam de ajuda. Os governos que abraçam e promovem princípios democráticos devem apoiá-los incondicionalmente.

É o correto a fazer. “

Texto de Alexandre Vidal Porto, Mestre em Direito por Hravard, oublica regularmente no cadern “Mundo” PPoescpublica regularmente no caderno “MUNdorto é escritor e diplomata. Mestre em direito pela Universidade Harvard, trabalhou nas embaixadas em Santiago, Cidade do México e Washington e na missão do país junto à ONU, em Nova York. Escreve aos