Populismo e corrupção
Uma das bandeiras atuais dos partidos
populistas é a da luta contra a corrupção; mas mais uma vez, como é sua caraterística
dominante, o populismo dá uma resposta simples a um problema complexo: advoga
um estado forte que, de uma penada, elimine os políticos corruptos e com eles,
claro, a democracia liberal, instalando um governo autocrático que reponha a
ordem e a autoridade. Esta resposta é simples porque não compreende, ou não quer
compreender, a complexidade do problema; contudo a maioria das pessoas,
precisamente porque é simples, aceita-a sem contestação e sem escrutínio.
O populismo não compreende desde logo
que existe contradição entre o sistema político e o sistema económico, isto é,
entre a democracia liberal e o capitalismo. De facto, enquanto a democracia propõe
igualdade de participação política e de representação, o capitalismo está nos antípodas porque o modo de produção capitalista está
longe de ser democrático: quem decide o que produzir e como produzir é o dono
do capital não são as pessoas que trabalham para o servir e que não são tidas
nem achadas, nem tem qualquer poder decisório. Por exemplo, se ele entender
deslocalizar a empresa, os trabalhadores não terão qualquer hipótese de anular
tal decisão por mais gravosa que esta seja para as suas vidas.
Todavia, malgrado esta contradição
entre democracia e capitalismo, os donos do capital precisam do Estado para
este lhes criar as condições mais favoráveis e por isso precisam de alguma
maneira de dominar o aparelho politico; de notar que este, em principio, nas
democracias liberais, já lhes é favorável
porque afinal os políticos na sua maioria são filhos das burguesias nacionais e
defendem os interesses destas, desse modo estão recetivos à adoção de medidas
que favoreçam o sistema económico vigente. Quando tal não sucede
espontaneamente, entram as luvas, os subornos, os favores, as placas giratórias
entre a esfera política e as empresas, etc., numa palavra, entra a corrupção.
No caso que estamos a
abordar, o populismo pretende que a resposta/solução do problema da corrupção consiste
em punir/eliminar os corruptos, uma resposta circular: há corrupção porque há corruptos,
se eliminarmos os corruptos, eliminamos a corrupção. Reparem na falácia, é como
dizer: há pobreza porque há pobres, logo a solução da pobreza está encontrada se
eliminarmos os pobres.
Esta resposta populista ignora
a verdadeira causa do fenómeno e desse modo não se propondo eliminar a causa não vai eliminar o efeito. Ora a causa da corrupção não são os políticos, é o sistema económico e os seus agentes diretos que exigem que as medidas políticas
sejam favoráveis aos seus interesses económicos; os corruptos são simplesmente o
meio de que os corruptores se servem para atingir os seus objetivos.
Assim, se um partido populista
vencer eleições e for governo, o mais certo é que vá subordinar as suas políticas
aos interesses do capital; se não o fizer, terá igualmente corruptos no seu
interior ou então terá os dias contados. Isto porque, qualquer que seja o
sistema político, o capitalismo tem de manipular a governação, seja através da própria
representação ou da sua cooptação por meio do suborno, vulgo corrupção.
Belo!!!
ResponderEliminar"Se Correr o Bicho Pega, Se Ficar o Bicho Come"
Exatamente como na peça do mesmo nome para o teatro (1966), de Oduvaldo Vianna Filho e Ferreira Gullar, logo no início do período da ditadura (1964) no Brasil
Obrigada pela reflexão.
Beijo. Ana BR
"Se Correr o Bicho Pega, Se Ficar o Bicho Come" Belo, adorei, já conhecia, mas nunca tinha pensado o verso neste contexto. Pois é, enquanto houver capitalismo, o regime politico ou colabora às boas e faz os fretes, ou, se não colabora, tarde ou cedo vai para as urtigas. Portanto, para abreviar: "Não são os políticos, é o capitalismo, estúpido!"
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