Na
relação amorosa heterossexual cria-se uma dinâmica que não é favorável a uma
“vivência democrática” da relação, se pretendermos que esta implique igualdade
entre os parceiros e respeito pelos seus legítimos interesses. E isto acontece, não por quaisquer situações conjunturais, mas
pela própria estrutura da relação amorosa com as suas exigências de abdicação
recíproca, fusão de almas, perda de individualidade e desejo de assimilar o
outro, exigências que como que fazem parte do próprio ideal amoroso.
Como
estes “elevados” objetivos não são realistas, pois colidem com interesses básicos e fundamentais de qualquer pessoa, o que vai acontecer é que a
assimetria de poder existente entre as partes vai jogar a favor da mais
forte, obrigando a outra a capitular. Claro que essa capitulação poderá ser
cumprida em nome do amor, mas não deixará de ser capitulação, bem nos antípodas
do ideal democrático. E aí renasce, como que das próprias cinzas, o velho
modelo de domínio/submissão que se encontra na base das estruturas sociais
patriarcais com a inerentes reprodução das hierarquias de poder. Deste modo, o
amor romântico, porque gera frustração e alimenta sentimentos de hostilidade, revela
o seu potencial destrutivo.
Há
quem reconheça esse potencial destrutivo do amor romântico, mas mesmo assim
defenda que ele precisa de evoluir no sentido da democratização. Todavia, se
aceitarmos esta tese, temos de perguntar como deve o amor lidar com o poder de
modo a não se deixar corromper; temos de perguntar como são construídas as
relações de poder e se há alguma hipótese de pôr um termo às relações de
dominação. Se não conseguirmos responder a estas questões, a tese fica sem base de sustentação.