segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Feministas são pessoas ...


“Feminismos não são isentos de relações de poder, e do atrito entre essas relações costumam sair faíscas de tretas. Mas me parece que o incêndio se dá porque o feminismo, infelizmente, também não está livre da monolética. (E a monolética vem a ser um neobobismo meu, para significar a anti-dialética, ou seja: dois monólogos concomitantes, sem que uma interlocutora escute, de fato, a outra.)

Feministas discordam umas das outras o tempo todo, e na maioria das vezes tudo corre bem: o discurso até progride por conta dessas divergências. Mas algumas feministas se digladiam por causa de suas divergências. Eu gostaria muito que não fosse assim, mas é. Feministas são – imagine você – pessoas.

Algumas pessoas são maravilhosas: divertidas, inteligentes, generosas. Outras pessoas são horrorosas: agressivas, bitoladas, egoístas. No entanto a maioria das pessoas não é nenhuma coisa nem outra, mas sim uma combinação do que é bom, ruim, belo e feio. Feministas são seres humanos, com defeitos e qualidades, que erram e acertam.
(…)
Mas estar cansada de algumas atitudes demonstradas por algumas feministas não invalida o movimento. Vou te contar um segredo: as feministas não precisam ser perfeitas. (Eu especulo, inclusive, que a expectativa pela “feminista perfeita” não passe de uma extensão da ideia machistinha de que as mulheres tenham que ser perfeitas. Mas essa é outra conversa.)

Seria bacana se sempre nos respeitássemos entre nós? Certamente. O patriarcado já gosta bastante de nos silenciar, de tornar nossa fala abjeta, ou nos condenar quando pisamos na bola e nos engasgamos com um conceito mal-articulado.

Mas o feminismo sempre vai ser um lugar de problematização, questionamento, desconstrução de privilégios e insights dolorosos. Seria lindo se conseguíssemos, sempre, discordar com elegância e seguir adiante. Mas é inevitável que, às vezes, uma problematização seja feita de forma agressiva. Algumas pessoas são agressivas. E feministas – já sabe – são pessoas.”

Excerto de um artigo publicado  na CartaCapital, 11-02-2016, de Joana Burigo