domingo, 22 de abril de 2012

Censurem a vítima!!!

Da Revista Espaço académico transcrevo  o artigo aqui publicado:
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Em Larache, uma pequena cidade no norte do Marrocos, uma menina de 16 anos cometeu suicídio depois de ser estuprada e obrigada a casar com seu estuprador.

Primeiro escândalo: o ponto de vista do “marido”. Trata-se de um homem que seqüestrou a menina e a estuprou. Ele cometeu dois crimes muito graves (estupro e pedofilia), de acordo com padrões universais. Ao invés de condená-lo a uma pena de prisão pesada, os tribunais marroquinos levaram-no a se casar com sua vítima, apagando de uma vez por todas os crimes dos quais foi culpado.

Segundo escândalo, considerando agora o pai da menina: trata-se de um homem que descobriu que sua filha adolescente acabara de ser estuprada, conformando-se em casá-la com seu carrasco para que as pessoas parassem de escarnecer ou apontar o dedo à família.

Terceiro escândalo: a presente opinião pública e as reações oficiais. As pessoas comuns e responsáveis, incluindo a Justiça, encontraram o meio de dizer que a menina consentiu e concordou em concretizar o casamento.

Quarto escândalo: além de ter sido estuprada, Amina Filali, a jovem menina de Larache, não encontrou nenhum conforto na sociedade, tampouco na justiça. Isto é o que a matou. Casando-a com seu estuprador, a família e o juiz agiram assim acreditando protegê-la. Infelizmente tal comportamento só contribuiu para a morte. Nesta história toda, cada um se salva como pode, para manter as aparências e defender seus próprios interesses. Somente uma pessoa não foi ouvida: a vítima!

Esta tragédia revela como nossas leis e nossa sociedade permanecem profundamente injustas, principalmente em relação às mulheres e menores. Começando pela justiça marroquina. A vida política parece sofrer do câncer da corrupção, conta com um arsenal de leis arcaicas e completamente estúpidas. O artigo 475 faz parte do lote. Estipula que ao se casar com sua vítima, um estuprador pode escapar da condenação criminal. O espírito desta lei é terrível porque justifica algo insensato e, mais grave, num caso de estupro não leva em conta a dor da vítima, mas sim a vergonha que se abate sobre ela e a família.

Quando somos vítima de um estupro ou abuso sexual, não se deve sentir a dor, mas a vergonha; é isso que pensa o legislador marroquino! A vítima torna-se um culpado por causa da vergonha. O que se tem a resguardar não é a dignidade da mulher ferida, mas a reputação de uma mulher imaculada. A lei desconsidera a queixa da estuprada e a condena ao silêncio. Ela reforça o caminho da crença popular que vê a vítima como culpada até que prove o contrário.

Claro, essa vergonha não é uma exceção eminente de nenhuma parte. Trata-se de uma mentalidade, que o legislador marroquino considera, de forma completamente retrógrada. Em sua mente, e de uma maneira muito global, a lei sempre foi tolerante com os autores de estupro, abuso sexual, pedofilia etc. Muitos artigos são capazes de nos deixar de cabelo em pé. Vista de perto, a legislação marroquina pode nos levar a pensar em um país da idade média, que prega e apaga os crimes de estupro e pedofilia, validando o casamento em detrimento do menor.

Vendo, agora, a sociedade marroquina no que ela tem de mais profundo e imutável, ela continua a considerar as mulheres e menores como cidadãos da segunda classe. Uma mulher ou uma criança são consideradas como “meio cérebro”. Vítimas de algum ato forçado, logo são vistas como culpadas!

Abrindo aqui um parêntese para lembrar, em 2004, quando um turista belga explorou as fotos pornográficas de um grupo de mulheres jovens em Agadir, incluindo menores; o caso afetou bastante a Bélgica, mas não o Marrocos. Em vez de protegidas por sua comunidade ou governo, as vítimas são punidas.

Quando um juiz se recusa a condenar um estuprador, como querem que o cidadão não pense na vítima também como culpada?

É de se esperar que o suicídio da menina de Larache possa servir como um exemplo capaz de ao menos ajudar a reformar as leis e as mentalidades marroquinas.


* Autoria de LAHCEN EL MOUTAQI , pesquisador da Universidade de Rabat V, no Marrocos. Publicado no CORREIO DA CIDADANIA, disponível emhttp://www.correiocidadania.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=7019.


quinta-feira, 19 de abril de 2012

Amor romântico – breve reflexão

“A ideia, validada culturalmente, de que o verdadeiro amor implica uma fusão de identidades é fonte de grande sofrimento. É o dilema clássico. Enquanto entidades psíquicas autónomas, resistimos à perda das nossas identidades. Em simultâneo, enquanto parceiros românticos, criados culturalmente, não apenas procuramos substituir a nossa existência separada por uma fusão romântica, como usamos a extensão do nosso sucesso para “nos tornarmos um” como padrão para medir a qualidade da nossa relação e do nosso casamento. Uma consequência trágica é que muitos casais saudáveis e autónomos se separam porque um ou outro deles sente o seu falhanço para atingir essa “totalidade metafísica” como um sinal de que o amor morreu.” John Bardi: Plato, Romance, & Self-Inquiry

sábado, 14 de abril de 2012

O que é uma mulher normal?!


Amanda Czerniawski, professora de Sociologia na Universidade de Temple, retomando o The Beauty Myth de Naomi Wolf ajuda-nos a não esquecer que, para as mulheres, sobretudo para as mais jovens, o corpo continua a ser uma prisão cujas grades elas próprias fabricam.

As imagens mediáticas e os ícones da moda são construções cujo objetivo é distorcer o nosso sentido acerca do que é um corpo normal; as dimensões das barbies que por aí andam não são normais nem representam mulheres normais mas cumprem às maravilhas o objetivo de colocar as mulheres normais numa situação de desconforto com a sua imagem, levando-as a utilizarem os mais extravagantes recursos, desde dietas rigorosas até cirúrgias estéticas perigosas e invasivas, para se aproximarem do ideal que lhes é proposto.
Por este meio insidioso as mulheres sujeitam-se a si mesmas, vigiando e disciplinando os seus próprios corpos, ao mesmo tempo que julgam estar a exercer a sua liberdade de escolha quando de facto continuam a perseguir o velho mito que ensina que o seu estatuto e a sua posição social dependem do corpo e da aparência física.