segunda-feira, 11 de abril de 2011

Controlar o corpo da mulher para manter a dominação


“À medida que as sociedades industriais mudam e que as próprias mulheres oferecem resistência ao sistema patriarcal, as velhas formas de dominação entram em erosão. Mas outras surgem, expandem-se e consolidam-se. Não mais se exige que as mulheres sejam castas ou modestas, que restrinjam a sua esfera de actividade ao lar, ou mesmo que realizem o seu destino apropriadamente feminino na maternidade: A feminilidade normativa cada vez se centra mais no corpo da mulher – não nos seus deveres ou obrigações ou mesmo na sua capacidade para gerar crianças, mas na sua sexualidade, mais precisamente na sua presumida heterossexualidade e na sua aparência.

De fato não há nada de novo na preocupação das mulheres com a juventude e beleza. O que é novo é o crescente poder da imagem numa sociedade também crescentemente orientada para o meio visual. Imagens de feminilidade normativa, pode alvitrar-se, substituíram os tratados religiosamente orientados do passado. Novo também é a expansão desta disciplina a todas as classes de mulheres e o seu envolvimento em todos os ciclos da vida. O que antes era característico da aristocrata ou da cortesã agora é rotina obrigatória para qualquer mulher, seja uma avó ou uma adolescente púbere.

Submeter-se a este novo poder disciplinar é ser «moderna» estar na moda, como argumentei, apresentado normalmente sob disfarce. Este poder é perfeitamente compatível com a corrente necessidade de trabalho pago para as mulheres, o culto da juventude e da elegância e as necessidades do capitalismo avançado de manter altos níveis de consumo. Além disso implica economia na imposição: já que são as próprias mulheres que praticam esta disciplina nos seus corpos e contra os seus corpos, os homens ficam de fora.

A mulher que retoca o make up meia dúzia de vezes ao dia para ver se a base empastou ou se a máscara desapareceu, que se preocupa que o vento e a chuva possam estragar o penteado, que verifica frequentemente se as meias estão bem esticadas, ou que, sentindo-se gorda, vigia constantemente o que come, tornou-se tal como o encarcerado do Panopticon, no seu próprio polícia, comprometido com a sua auto-vigilância. Esta auto-vigilância é uma forma de obediência à ordem patriarcal. É também o reflexo na consciência da mulher do fato de que ela está sob vigilância em aspectos em que ele não está; que independentemente do que quer que ela se torne, ela é fundamentalmente um corpo designado para agradar ou excitar.

Assim, foi induzido em muitas mulheres, nas palavras de Foucauld, «um estado de consciência e de permanente visibilidade que assegura o funcionamento automático do poder». Já que os padrões de aceitabilidade do corpo feminino são impossíveis de realizar completamente, requerendo como requerem a virtual transcendência da natureza, uma mulher tem de viver grande parte da sua vida com um sentimento permanente de deficiência corporal. Desse modo, um controlo apertado do corpo ganhou uma nova forma de domínio sobre a mente.”

Sandra Lee Bartky, “Foucault, Femininity and the Modernization of Patriarchal Power,” in Katie Conboy e outras, Writing on the Body: female embodiment and feminist theory, p. 148,149.

6 comentários:

  1. Totalmente de acuerdo contigo, Adilia. No tengo nada que añadir. Está genial tu entrada.

    Un abrazo.

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  2. Oi, Enrique
    Obrigada pela visita e pelo comentario.
    abraço, adília

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  3. Excelente leitura das funcionalidades no corpo no atual panorama, a partir das considerações de Michel Foucault! Gostaria contudo de lhe perguntar, com base nas suas afirmações: Será que "ela está sob vigilância em aspectos em que ele não" está? Em que grau se dá essa diferença? Em que sociedades e realidades? É que vivo no Brasil, Adélia, onde a imposição da beleza e o cuidado escravo com o corpo, por meio de dietas, é notavelmente dominante, inclusive entre os homens! Abraço!

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  4. Oi Andréia, eu como brasileira observo que mesmo que essa diferença seja um pouco menor no Brasil, ainda assim ela existe. Na minha família é feio um homem ser gordo, porém é muito mais aceitável que uma mulher ser gorda. Temos que nos vigiar o tempo todo. Basta observar uma festa: quem tem que ficar de salto e retocando a maquiagem? Não é o homem, né. Aliás, em poucos minutos as gravatas já foram para o alto e eles estão dançando confortavelmente... agora as mulheres, só depois de muita bebida mesmo, rsrsrsrs.

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  5. Oi Andrea
    Penso que a Flovi já respondeu, de fato a feminilidade ao ser construida focalizada na aparência reduz a mulher a ser para os outros e a interiorizar o olhar dos outros sobre ela, coisa que não ocorre com o homem.

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  6. Realmente concordo com o v. ponto de vista.

    david

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