sábado, 10 de novembro de 2012

O amor romântico tem uma história

Está na hora de nos perguntarmos sobre o futuro do amor romântico: será que ele vai subsistir ou estará condenado a desaparecer?

 A cultura popular dominante nas sociedades do Ocidente continua a desenvolver-se como se nada estivesse para mudar: canções, filmes, novelas televisivas continuam a apostar no ideal romântico e a comover audiências, nomeadamente audiências femininas. Os apaixonados alimentam ainda a secreta esperança de um amor para sempre, malgrado todas as aparências, visíveis no enorme aumento de divórcios. Mas as pessoas mais avisadas sabem que o amor romântico teve um começo no tempo e no espaço e nada impede que tenha um termo; esteve ligado na sua emergência a determinadas condições sócio económicas e nada permite supor que se mantenha, se as condições que lhe deram origem se modificarem substancialmente.

 Historiadores, sociólogos e filósofos lembram-nos que o ideal romântico começou a ser difundido quando, nas primeiras décadas do século XIX, na sequência da revolução industrial, se verificaram alterações profundas na unidade familiar que se simplificou, restringindo os laços de afinidade a um número reduzido de pessoas – pais e filhos – e substituiu a família alargada dos séculos precedentes que exercia um controlo muito mais constringente sobre todos os membros família, sobretudo os mais jovens.

Na ausência desse cimento aglutinador, começou a desenvolver-se a ideia de que os matrimónios se deviam basear no amor romântico, caraterizado por uma série de clichés, ainda hoje bem presentes; um deles era o da necessidade de existir paixão entre os elementos do casal, coisa que no passado, contrariamente, era vista como elemento perturbador da estabilidade e dos interesses da família alargada, o que facilmente se compreende, se recordarmos que a maioria dos casamentos era de conveniência. Também então o desejo erótico – dos homens, claro - era canalizado para fora do matrimónio e tornado possível pela existência de instituições várias, nomeadamente a prostituição. Agora, a atração erótica passa a ser canalizada para o ideal romântico da pessoa amada e é ligada ao casamento.

No século XIX, sobretudo para a burguesia, que por sua vez se há-de tornar num modelo para as classes inferiores, dois conceitos ganham foros de cidadania, o de individualidade e o de intimidade. Porque o mundo lá fora é frequentemente um ambiente agressivo e hostil onde a pessoa não é reconhecida na sua identidade individual, torna-se mais importante a esfera privada onde ela pode ser valorizada e apreciada. Por sua vez, a afirmação do indivíduo e do individualismo tornam mais premente a escolha pessoal que vai passar a ocupar um lugar importante no ritual do casamento de onde tinha estado desde sempre ausente. Se no passado o casamento era um “negócio” da família, agora passa a ser uma questão de escolha e desse modo dependente da atração sexual recíproca, sublimada e disfarçada através do ideal romântico.

Os sociólogos dão uma ajuda e explicam que casamento de amor foi a “instituição” que permitiu a integração dos indivíduos num mundo novo, completamente diferente do dos séculos precedentes, onde a nota dominante passa a ser o isolamento dos indivíduos e a fragmentação social.

Nesse tipo de sociedade, fragmentada e individualista, as pressões externas para manter a união do casal começam a enfraquecer, mas em certa medida continua a ser necessário manter a estabilidade das uniões para efeitos quando mais não seja da criação das novas gerações; assim torna-se necessário substituir o dever e os constrangimentos familiares por um novo tipo de pressão, e é neste contexto que surge o ideal romântico de amor; por outro lado, num meio onde as coisas mudam com demasiada rapidez, a paixão romântica permite ao casal construir uma ligação que considera preciosa porque o amado e só o amado dá ao amante o sentimento de que é uma pessoa única e insubstituível e lhe fornece um porto de abrigo para a impiedade de um mundo onde, se não a hostilidade, pelo menos a indiferença o esperam. É através do amor que a vida parece ganhar sentido.
Antony Giddens, um filósofo contemporâneo que se debruçou sobre o tema, reconhece que o amor romântico exerceu uma função importante no quadro da emergência da sociedade capitalista, conferindo sentido à vida das pessoas; mas considera que esse papel não mais é necessário e que o surgimento de novas condições contribuirá necessariamente para o declínio do ideal romântico que será substituído por aquilo a que chama amor confluente.

Giddens aponta mesmo o fracasso do amor romântico e o seu potencial destrutivo, pois, em seu entender, contribuiu para alimentar falsas espectativas e acabou criando mais infelicidade do que seria desejável. Por outro lado, a mística romântica, criando sentimentos de culpa nas pessoas, não permitiu que explorassem a sua liberdade a vários níveis, nomeadamente ao nível da liberdade sexual.

Hoje segundo Giddens, já não há lugar para o amor romântico, porque para as pessoas, mercê de vários e convergentes movimentos de libertação, a atração erótica passou a gozar de uma legitimidade que nunca conheceu antes e o controlo da reprodução tornou-se acessível. Desse modo, estabeleceu-se um novo tipo de relação amorosa - o  “amor confluente”; característico do amor confluente é a “relação pura”, uma relação que apenas se mantem enquanto for gratificante para o casal e corresponder ao que dela esperam em termos de satisfação sexual recíproca; é pois uma relação contingente; não há nenhum compromisso indestrutível nem nenhum tipo de obrigação moral, estão juntos enquanto se sentirem bem juntos.

Este tipo de relação amorosa foi possível porque há maior liberdade dos homens e sobretudo das mulheres, passando a existir aquilo que Giddens designa de plasticidade sexual que é o contrário da rigidez sexual anteriormente existente, quando o número de parceiros e de práticas sexuais era bem mais limitado. Hoje as pessoas sentem-se muito mais independentes e também já perceberam que o ideal de "fusão de almas" do amor romântico é uma ratoeira que aprisiona homens e sobretudo mulheres, incapazes de exprimirem verdadeiramente a sua liberdade e autonomia.

 

9 comentários:

  1. Ta aí a mais uma ação do marxismo cultural e de toda a lavagem cerebral imposta pelo feminismo pela turma do gramscismo na cultura ocidental . O amor romãntico findou na medida que os valores familiares morais e éticos foi destruida por essa onda que vem assolando o mundo.São duas coisas correlatas amor x família se uma dessas partes se rompe fatalmente a outra fica comprometida.Não existe familia sem amor e portanto com a dissolução do amor a familia fica comprometida.
    O amor acabou em nome da liberdade sexual.Em nome do "poder" da mulher em querer se tornar igual a um homem. Qual homem heterossexual tem amor por outro homem? Sim pq a mulher moderna é uma caricatura de homem.
    Uma salva de palmas para os verdadeiros culpados pela degradação da familia(amor) ...

    ResponderEliminar
  2. All is need is love...será que os Beattles eram reacionários???

    ResponderEliminar
  3. "o ideal de "fusão de almas" do amor romântico é uma ratoeira que aprisiona homens e sobretudo mulheres, incapazes de exprimirem verdadeiramente a sua liberdade e autonomia."

    Depois reclamam que os homens não querem nada sérios e nos vêem como mercadorias sxeuais descratáveis! Parabéns feministas por nos degradarem cada vez mais!!Depois não venham reclamar que não tem mais aquele apóio de antigamente de muitas de nós!!!

    ResponderEliminar
  4. É lamentável que até ao momento os unicos comentários a este texto sejam de criaturas reacionarias que para além do mais parecem não ter percebido nada do que foi dito.
    De facto, o primeiro comentador, que se calhar até é o segundo e o terceiro, parece não ter percebido que antes do desenvolvimento do ideal româtico de amor havia família e que familia ... E também não sabe que o termo familia no seu sentido originário significava o conjunto de servos que um homem tinha à sua disposição e ordem.
    Com famílias constituidas por criaturas do jaez do comentador/a, o melhor é mesmo não haver, pois com amigos destes não precisamos de inimigos.
    Também não percebeu que uma mulher como qualquer ser humano tem valor independentemente de casar ou não com um homem e parece não perceber o obvio: é que com a fusão romantica, uma espécie dde dois em um, esse um é quase inevitavelmente masculino.

    ResponderEliminar
  5. "Antony Giddens, um filósofo contemporâneo que se debruçou sobre o tema, reconhece que o amor romântico exerceu uma função importante no quadro da emergência da sociedade capitalista, conferindo sentido à vida das pessoas; mas considera que esse papel não mais é necessário e que o surgimento de novas condições contribuirá necessariamente para o declínio do ideal romântico que será substituído por aquilo a que chama amor confluente."

    A desconstrução originada pela perspectiva de liberdade sexual cria diversos eufemismos e outras formas de amor ; O amor romântico(o da família) foi substituído por um "amor diferente" ,momentâneo,efêmero,fulgaz,amor de minutos,"só sexo", ou qualquer outro adjetivo que venha qualificar a degradação da sociedade moderna ,em especial, a mulher moderna.

    Façamos então como nos ensinamentos cristãos que segundo as idéias revolucionárias de marx ,já era o prenuncio dessa nova ótica de vida contemporânea : "Amemos uns aos outros" .

    ResponderEliminar
  6. Apesar de em alguns aspetos eu considerar que a chamada "revolução sexual" foi, como aconteceu com outras revoluções, cooptada por interesses que em principio lhe são estranhos e que até podem contribuir para subverter os seus propositos, não percebo a insistencia na degradação da mulher moderna, mas afinal de que é que estamos a falar? Só agora é que a mulher sofre um processo de degradação?! No passado era um ser inteiro e integro?! livre para decidir da sua vida, capaz de autonomia moral? Com direito a aceder à cultura e ao conhecimento?
    Façam-me um favor, estudem alguma coisa e sobretudo ganhem juizo!!!
    , ,

    ResponderEliminar
  7. um artigo sobre o amor: http://www.pikaramagazine.com/?p=5605

    ResponderEliminar
  8. Na minha concepção o amor romantico nao eh a mesma coisa pro homem e pra mulher. A fusao acontece porém somente a mulher "sacrifica" uma parte de sua personalidade. O homem que nao vive a função romantica acaba tendo que lidar com o lado feminino de sua personalidade. Eu acredito que esse ideal de amor romantico eh a tentativa de fazer "eterno"aquilo que nao pode ser eterno ; o homem e a mulher podem se encontrar, porém, eles jamais poderão estar sempre juntos ( EU ADORO ESSE ASSUNTO =))

    ResponderEliminar
  9. olÁ Adilia você poderia por favor me dizer seu sobrenome? gostaria de te referenciar em um TCC

    ResponderEliminar