Se aceitarmos que a relação sexual é,
como todas as relações interpessoais, uma relação de conflito, na qual o Eu,
embora precise do Outro para ser confirmado na sua identidade, também o procura
objetificar para não ser ele próprio objetificado, percebemos facilmente a
estratégia sexual do sádico.
Cada ser humano é corpo e consciência,
“ser em si” e “ser para si”, na
terminologia sartriana. O corpo pode ser facilmente dominado, mas a consciência
resiste à dominação e aquele que pretende dominar não se consegue dar por
satisfeito. Ele quer também vergar aquela consciência qe se rebela.
Temos então que o sádico não quer
apenas apropriar-se do corpo, quer também dominar a consciência que habita esse
corpo; mas a consciência só poderá ser dominada se ela própria for reduzida ao
corpo - o que acontece quando o corpo experimenta dor e sofrimento intenso; nesse
caso, dor e sofrimento impõem-se de tal maneira que “a faticidade invade a
consciência” e esta, enquanto consciência reflexiva, é anulada.
O que isto significa é que aquele
que sofre não consegue pensar em mais nada senão no sofrimento físico ou psíquico
que lhe está a ser inflingido; esse sofrimento absorve de tal maneira a sua
atenção que a sua capacidade reflexiva desaparece e com ela a possibilidade de
se afirmar perante o outro que, aparentemente, sai vitorioso; e dizemos
aparentemente, porque o que ele queria era apropriar-se da consciência do outro,
mas a estratégia usada levou à destruição do “bem” perseguido com tanto afinco.
Por tudo isto, deve entender-se o
sadismo como a consequência necessária de uma percepção das relações sexuais
como relações de domínio/submissão, que numa forma mais ou menos mitigada é a
que se encontra presente no ainda atual paradigma sexual.