Esquerdas
A desgraça das esquerdas
As esquerdas, profundamente
ressentidas com o colapso da união soviética (1991) cometeram erros gravíssimos
que estamos a pagar com língua de palmo. Em primeiro lugar ficaram reféns desse
ressentimento e desistiram de estudar o fenómeno histórico em si mesmo, de o
tentar compreender, de encontrar as suas motivações mais profundas.
Com esta atitude
permitiram que triunfasse a narrativa neoliberal de que o comunismo fracassara,
que o marxismo era coisa do passado, que não havia alternativa ao capitalismo
(TINA- There Is No Alternative, como gostava de dizer M Thatcher).
Ora, por motivos de
vária ordem, o que colapsou foi uma tentativa de pôr de pé uma sociedade
socialista, não foi o socialismo; não foi o marxismo que se tornou irrelevante e
passadista. Marx continua atual, embora
precisando de ser repensado em muitas e importantes matérias, já que viveu e
escreveu num contexto que hoje se alterou profundamente. Mas precisamente, dada
a sua atualidade, as universidades, dominadas por interesses neoliberais,
(fenómeno nítido nos estados unidos) escamoteiam o seu estudo, e por exemplo, pelo
menos em Portugal, fazem-se teses de doutoramento sobre tudo e mais um par de botas,
mas o marxismo e a sua análise é tabu e é tabu porque os neoliberais já perceberam
uma coisa que a esquerda ainda não percebeu é que Marx é dinamite pura, depois
de o lermos não fica pedra sobre pedra. Que a direita neoliberal impeça o
estudo de Marx percebe-se perfeitissimamente, que a esquerda não o estude,
deixa-me estupefacta!
E mais a esquerda, pelo menos a que conheço, em Portugal, tem descurado completamente a educação política que é fundamental para percebermos a realidade; diz mal, repete slogans, faz reivindicações pontuais, mas não é nunca pedagógica, não explica, não identifica o racional que preside a estas e aquelas decisões políticas, não desconstrói a ideologia dominante quando ela se manifesta nesta ou naquela situação particular e hoje é neste campo que se ganham e perdem lutas. E é minha convicção que não o faz porque é ignorante já que não estuda, não debate ideias, visões do mundo, etc. é uma esquerda de trazer por casa! Presa do senso comum. Com isso criou as condições para o neoliberalismo fazer a sua caminhada, sem obstáculos de maior.
É esse o vazio que se sente na política dita de esquerda.Eu interpreto a situação como a anulação da geração que cresceu com o 25 de abril. Fomos educados com a ideia de que a democracia, só por si, assegurava os nossos direitos e o bem-estar do povo. Transmitimos essa ideia, enaltecemos o que conquistámos e, depois, deixámos acontecer o retrocesso. A Adília tem razão. O descrédito em que caiu o leste, marginalizou o sistema filosófico em que se baseou a praxis, naturalmente imperfeita, dos regimes comunistas. E hoje em dia, muitas pessoas como eu dizemo-nos de esquerda, mas não fizemos nada para elevar e sustentar a utopia.
ResponderEliminarObrigada Adília!
Ana, Obrigada pelo seu comentário, é gratificante ter feed back, de outra maneira parece que estamos a falar, neste caso a escrever, pro boneco ...
ResponderEliminarQuanto à sua explicação, embora me pareça pertinente, o fenómeno é mais vasto, infelizmente. O descredito só pode surtir efeito porque não se pensou mais no assunto, os intelectuais parecem não ter percebido qual deveria ter sido o seu papel e nesse caso os partidos políticos tem muitas responsabilidades no cartório.
Olá, Adília, gostei muito de ler a tua reflexão sobre " as esquerdas" e a sua despreparação total para defenderem a ideologia Marxista e a capacidade que tem para ser implementada com adaptações decorrentes do contexto do mundo em que atualmente vivemos. Referes o quanto o Neoliberalismo tem aproveitado desta ignorância, dando assim crédito à ideia de que efetivamente não há alternativa ao Sistema Capitalista. Pessoalmente considero este sistema profundamente preverso mas, dado o estado mundial de um capitalismo selvagem globalizado não estou a ver que nova experiência comunista marxista possa sair em alternãncia ao status quo em que a humanidade vive. Que saída propões para inverter tal situação. O mundo rola a uma velocidade vertiginosa, será que o Marxismo tem tempo, modo e meios humanos de fazer agulhagem para alterar o rumo da realidade existente?
ResponderEliminarCaro/a anónimo/a
ResponderEliminarObrigada pelo comentário.
Quanto à questão que nos preocupa, temo bem que tenhamos de enfrentar a breve trecho uma outra travessia do deserto, com regimes, não comunistas, mas fascistas um pouco por toda a parte. Está tudo armado nesse sentido. Repara, a elite que manda, os tais 1%, pode não gostar do fascismo, mas economicamente não é afetada e é isso que considera importante, por isso não vai mexer uma palha nem opor-se; a classe popular como o nome indica adere ao populismo - que é a política do paleolítico (pedra lascada)- apresenta explicações fáceis para os problemas complexos e remédios verossímeis embora mistificadores mas ninguém percebe a mistificação: expulsar os emigrantes, defender a supremacia dos brancos que coitadinhos estão a ser ultrapassado pelos negros, reenviar as mulheres novamente para o seu devido lugar, ensinar o respeitinho e o amor à ordem, e entra tudo novamente nos eixos. Depois o neoliberalismo está a tornar-se insuportável, as pessoas não aguentam, mesmo com telemóveis, internet, big brothers e sexo virtual, faltam laços (que o neoliberalismo destruiu) que as vinculem ao social e então refugiam-se em seitas religiosas salvíficas e reacionárias que como se costuma dizer ‘ajudam à missa’. Deste modo o fascismo tem tudo para dar certo enquanto qualquer versão socialista teria logo à partida de vencer em condições atuais extremamente adversas a resistência dos 1% - o que seria altamente improvável.
Portanto para já estou profundamente pessimista. Procuro compreender, e pôr em comum – comunicar- o que compreendo, mas nada mais consigo fazer.