Passa-se com o feminismo e com as feministas algo de paradoxal. É óbvio que as ideias feministas se desenvolveram no contexto de ideologias de esquerda pois estas ideologias, ao afirmarem ideais de igualdade e de liberdade para os seres humanos em geral, independentemente da origem de classe, implicam contradição se não estenderem essa mesma igualdade e liberdade às mulheres. Se recuarmos às origens do movimento encontramos os ideais da Revolução Francesa dos fins do século XVIII, o movimento pela abolição da escravatura nos Estados Unidos em meados do século XIX, as lutas do movimento operário dos fins do século XIX e inícios do século XX e ainda a contestação radical dos anos sessenta. Em todos estes momentos, as mulheres reivindicaram para si em concreto aquilo que era exigido para todos em abstrato. Mas curiosamente, os homens de esquerda, com demasiada frequência para se poder considerar aleatório, mostraram-se francamente hostis à emancipação das mulheres. Basta lembrarmos alguns exemplos sugestivos, o caso de Rousseau, paladino dos ideais democráticos da época, e de Proudhon, defensor das classes trabalhadoras – ambos declaradamente misóginos -, os lideres da luta pela abolição da escravatura e a sua insistência em considerarem inoportuna a reivindicação do sufrágio feminino ou na década de sessenta a recusa dos jovens intelectuais progressistas em inscreverem a questão das mulheres na sua agenda politica centrada na contestação à guerra do Vietnam. A esquerda sempre considerou que a luta das mulheres não era prioritária, revelando enorme miopia politica pois não percebeu quão revolucionário seria esse movimento; muitos sectores da esquerda, politicamente progressistas mostraram-se socialmente reacionários. E não se julgue que são apenas politicos de esquerda a mostrarem tal insensibilidade, encontramos a mesma tendência em cineastas, autores literários consagrados, homens das artes plásticas, etc, etc, o que parece provar que de facto o feminismo se for bem sucedido vai minar o privilégio masculino e este é universal, isto é, dele aproveitam todos os homens de todos os quadrantes politicos, ignorantes ou cultos, ricos ou pobres.
Em contrapartida, vemos que a direita política não tem hesitado em apoiar mulheres para ocuparem cargos politicos importantes; percebendo que a ascensão das mulheres é uma questão de tempo, decide apoiar aquelas que não vão colocar em causa os interesses da direita e com isso só mostra que percebe muito mais de estratégia. Hoje por exemplo, há um certo numero de mulheres que ocupam cargos importantes na cena politica, mas a maioria são mulheres de direita, caso por exemplo de Cristine Lagarde ou de Angela Merkel. Com este lance a direita aproveita a energia de mulheres carismáticas para consolidar os seus objectivos e “lima os dentes” das autênticas feministas.