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quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Juventude e beleza são importantes - mas só para as mulheres


Juventude e beleza são importantes - mas só para as mulheres!
Esta afirmação é mais do que comprovada, se conhecermos alguns dados relativos a atrizes e atores de filmes de Hollywood. Para encontrar papéis principais, as mulheres tem de ser belas, jovens e esbeltas. Em contrapartida os galãs continuam a ser galãs, mesmo quando se aproximam ou mesmo excedem os cinquenta, os casos são tantos que quase não seria preciso enumerá-los, mas não se resiste a apontar, a título de mero exemplo, George Clooney, Richard Gere, Harrison Ford, Robert de Niro, ou ainda Robert Redford, este último em idade bem avançada.

Para eles, as rugas, os cabelos grisalhos e a flacidez são sinal de distinção, para elas, de exclusão. E, o que é mais, continuam a contracenar com jovens atrizes que podiam ser suas filhas ou às vezes … netas.

Depois dos quarentas não há lugar para as mulheres na meca do cinema, pelo menos no que toca a papéis principais; assim, enquanto os espectadores do sexo masculino se podem identificar com “heróis” de cabelos brancos, barriga próspera e idade madura, as mulheres estão condenadas a fazerem os possíveis e impossíveis, numa tentativa tão desesperada quanto caricata, para se aproximarem das jovens esbeltas, lindas e jovens que lhes apresentam como modelo exclusivo.

Atrizes notáveis deixam de ter papéis; em contrapartida atores medíocres continuam a “vender” bem. Em 2009 a revista Spike publicou os nomes de atrizes que teriam passado o prazo de validade; agora, reparem, a lista inclui nomes como os de Nicole Kidman (43), Sarah Jessica Parker (45), Cameron Diaz (38), e Julia Roberts (43).

Este escandaloso tratamento diferencial de homens e mulheres ao nível do cinema é mais um sintoma do sexismo ainda reinante e mostra bem o mau negócio que a preocupação excessiva com a aparência representa para as mulheres, preocupação essa que afinal, bem vistas as coisas, lhes é imposta socialmente, embora também tenha de se reconhecer que muitas ficam de tal modo deslumbradas que não conseguem resistir-lhe, sem perceberem que, passados os anos áureos, só lhes resta a apagada e vil tristeza dos lugares menores e de uma certa forma de inexistência.

 

 

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

"Caça às bruxas"


Transcrevo, com a devida vénia, o artigo de Rosangela Angelin publicado no blog da Revista Espaço Académico:

http://espacoacademico.wordpress.com/2012/08/04/a-caca-as-bruxas-uma-interpretacao-feminista/

A “caça às bruxas é um elemento histórico da Idade Média. Entre os séculos XV e XVI o “teocentrismo” – Deus como o centro de tudo – decai dando lugar ao “antropocentrismo“, onde o ser humano passa a ocupar o centro. Assim, a arte, a ciência e a filosofia desvincularam-se cada vez mais da teologia cristã, conduzindo, com isso a uma instabilidade e descentralização do poder da Igreja. Como uma forma de reconquistar o centro das atenções e o poder perdido, a Igreja Católica instaurou os “Tribunais da Inquisição”, efetivando-se assim a “caça às bruxas“. Mas quem eram, enfim, estas mulheres que fizeram parte de um capítulo tão horrendo da história da humanidade, e por que o feminismo retoma as bruxas como um dos seus principais símbolos?

1. A “caça às bruxas”
A “caça às bruxas” durou mais de quatro séculos e ocorreu, principalmente, na Europa, iniciando-se, de fato, em1450 e tendo seu fim somente por volta de 1750, com a ascensão do Iluminismo. A “caça às bruxas” admitiu diferentes formas, dependendo das regiões em que ocorreu, porém, não perdeu sua característica principal: uma massiva campanha judicial realizada pela Igreja e pela classe dominante contra as mulheres da população rural (EHRENREICH & ENGLISH, 1984: 10). Essa campanha foi assumida, tanto pela Igreja Católica, como a Protestante e até pelo próprio Estado, tendo um significado religioso, político e sexual. Estima-se que aproximadamente 9 milhões de pessoas foram acusadas, julgadas e mortas neste período, onde mais de 80% eram mulheres, incluindo crianças e moças que haviam “herdado este mal” (MENSCHIK, 1977: 132).

1.1. Quem eram as bruxas
Ao buscarmos uma definição do termo “bruxa” em dicionários, logo pode-se perceber a direta vinculação com uma figura maléfica, feia e perigosa. Neste sentido, também os livros infanto-juvenis costumam descrever histórias onde existe uma fada boa e linda e uma bruxa má e horrível. [1]
Ao analisarmos o contexto histórico da Idade Média, vemos que bruxas eram as parteiras, as enfermeiras e as assistentes. Conheciam e entendiam sobre o emprego de plantas medicinais para curar enfermidades e epidemias nas comunidades em que viviam e, consequentemente, eram portadoras de um elevado poder social. Estas mulheres eram, muitas vezes, a única possibilidade de atendimento médico para mulheres e pessoas pobres. Elas foram por um longo período médicas sem título. Aprendiam o ofício umas com as outras e passavam esse conhecimento para suas filhas, vizinhas e amigas.
Segundo afirmam EHERENREICH & ENGLISH (1984, S. 13), as bruxas não surgiram espontaneamente, mas foram fruto de uma campanha de terror realizada pela classe dominante. Poucas dessas mulheres realmente pertenciam à bruxaria, porém, criou-se uma histeria generalizada na população, de forma que muitas das mulheres acusadas passavam a acreditar que eram mesmo bruxas e que possuíam um “pacto com o demônio”.
O estereótipo das bruxas era caracterizado, principalmente, por mulheres de aparência desagradável ou com alguma deficiência física, idosas, mentalmente perturbadas, mas também por mulheres bonitas que haviam ferido o ego de poderosos ou que despertavam desejos em padres celibatários ou homens casados.

1.2. A “caça às bruxas e o “Tribunal da Inquisição”
Com a ascensão da Igreja Católica, o patriarcado imperou, até mesmo porque Jesus era um homem. Neste contexto, tudo o que a mulher tentava realizar, por conta própria, era visto como uma imoralidade (ALAMBERT, Ano II: 7). Os costumes pagãos que adoravam deuses e deusas passaram a ser considerados uma ameaça. Em 1233, o papa Gregório IX instituiu o Tribunal Católico Romano, conhecido como “Inquisição” ou “Tribunal do Santo Ofício”, que tinha o objetivo de terminar com a heresia e com os que não praticavam o catolicismo. Em 1320 a Igreja declarou oficialmente que a bruxaria e a antiga religião dos pagãos representavam uma ameaça ao cristianismo, iniciando-se assim, lentamente, a perseguição aos hereges.
A “caça às bruxas” coincidiu com grandes mudanças sociais em curso na Europa. A nova conjuntura gerou instabilidade e descentralização no poder da Igreja. Além disso, a Europa foi assolada neste período por muitas guerras, cruzadas, pragas e revoltas camponesas, e se buscava culpados para tudo isso. Sendo assim, não foi difícil para a Igreja encontrar motivos para a perseguição das bruxas.
Para reconquistar o centro das atenções e o poder, a Igreja Católica efetivou a conhecida “caça às bruxas”. Com o apoio do Estado, criou tribunais, os chamados “Tribunais da Inquisição” ou “Tribunais do Santo Ofício”, os quais perseguiam, julgavam e condenavam todas as pessoas que representavam algum tipo de ameaça às doutrinas cristãs. As penas variavam entre a prisão temporária até a morte na fogueira. Em 1484 foi publicado pela Igreja Católica o chamado “Malleus Maleficarum”, mais conhecido como “Martelo das Bruxas”. Este livro continha uma lista de requerimentos e indícios para se condenar uma bruxa. Em uma de suas passagens, afirmava claramente, que as mulheres deveriam ser mais visadas neste processo, pois estas seriam, “naturalmente”, mais propensas às feitiçarias (MENSCHIK, 1977: 132 e EHRENREICH & ENGLISH, 1984: 13).

1. 3. Os “crimes” praticados pelas bruxas
No contexto da “caça às bruxas” havia várias acusações contra as mulheres. As vítimas eram acusadas de praticar crimes sexuais contra os homens, tendo firmado um “pacto como demônio”. Também eram culpadas por se organizarem em grupos – geralmente reuniam-se para trocar conhecimentos acerca de ervas medicinais, conversar sobre problemas comuns ou notícias. Outra acusação levantada contra elas, era de que possuíam “poderes mágicos”, os quais provocavam problemas de saúde na população, problemas espirituais e catástrofes naturais (EHRENREICH & ENGLISH, 1984: 15).
Além disso, o fato dessas mulheres usarem seus conhecimentos para a cura de doenças e epidemias ocorridas em seus povoados, acabou despertando a ira da instituição médica masculina em ascensão, que viu na Inquisição um bom método de eliminar as suas concorrentes econômicas, aliando-se a ela.

1.4. Perseguição e condenação à fogueira
Qualquer pessoa podia ser denunciada ao “Tribunal da Inquisição”. Os suspeitos, em sua grande maioria mulheres, eram presos e considerados culpados até provarem sua inocência. Geralmente, não podiam ser mortos antes de confessarem sua ligação com o demônio. Na busca de provas de culpabilidade ou a confissão do crime, eram utilizados procedimentos de tortura como: raspar os pêlos de todo o corpo em busca de marcas do diabo, que podiam ser verrugas ou sardas; perfuração da língua; imersão em água quente; tortura em rodas; perfuração do corpo da vítima com agulhas, na busca de uma parte indolor do corpo, parte esta que teria sido “tocada pelo diabo”; surras violentas; estupros com objetos cortantes; decapitação dos seios. A intenção era torturar as vítimas até que assinassem confissões preparadas pelos inquisidores. Geralmente, quem sustentava sua inocência, acabava sendo queimada viva. Já as que confessavam, tinham uma morte mais misericordiosa: eram estranguladas antes de serem queimadas. Em alguns países, como Alemanha e França, eram usadas madeiras verdes nas fogueiras para prorrogar o sofrimento das vítimas. E, na Itália e Espanha, as bruxas eram sempre queimadas vivas. Os postos de caçadores de bruxas e informantes eram financeiramente muito rentáveis. Estes, eram pagos pelo Tribunal por condenação ocorrida e os bens dos condenados eram todos confiscados.
O fim da “caça às bruxas” ocorreu somente no século XVIII, sendo que a última fogueira foi acesa em 1782, na Suíça. Porém, a Lei da Igreja Católica que fundou os “Tribunais da Inquisição”, permaneceu em vigor até meados do século XX. A “caça às bruxas” foi, sem dúvida, um processo bem organizado, financiado e realizado conjuntamente pela Igreja e o Estado.

2. O feminismo e o resgate da imagem das bruxas
Diante de tantas mortes de mulheres acusadas por bruxaria durante este período, podemos afirmar que o ocorrido se tratou de um verdadeiro genocídio contra o sexo feminino, com a finalidade de manter o poder da Igreja e punir as mulheres que ousavam manifestar seus conhecimentos médicos, políticos ou religiosos. Existem registros de que, em algumas regiões da Europa a bruxaria era compreendida como uma revolta de camponeses conduzida pelas mulheres (EHRENREICH & ENGLISH, 1984: 12). Nesse contexto político, pode-se citar a camponesa Joana D`arc, que aos 17 anos, em 1429, comandou o exército francês, lutando contra a ocupação inglesa. Esta acabou sendo julgada como feiticeira e herege pela Inquisição e queimada na fogueira antes de completar 20 anos. Diante disso, configurava-se a clara intenção da classe dominante em conter um avanço da atuação destas mulheres e em acabar com seu poder na sociedade, a tal ponto que se utilizava meios de simplesmente exterminá-las.
O feminismo busca resgatar a verdadeira imagem das bruxas em nossa história, analisando não somente os aspetos religiosos, mas também políticos e sociais que envolveram a “caça às bruxas” na Idade Média. No olhar feminista, as bruxas, através de seus conhecimentos medicinais e sua atuação em suas comunidades, exerciam um contrapoder, afrontando o patriarcado e, principalmente, o poder da Igreja. Em verdade, elas nada mais foram do que vítimas do patriarcado (ALAMBERT, Ano II, n° 48: 7). Atualmente, as mulheres ainda continuam sendo discriminadas e duramente criticadas por lutarem pela igualdade de gênero e a divisão do poder social e econômico, que ainda é predominantemente masculino, continuando vítimas do patriarcado. Por isto, as bruxas representam para o movimento feminista não somente resistência, força, coragem, mas também a rebeldia na busca de novos horizontes emancipadores.

sábado, 14 de abril de 2012

O que é uma mulher normal?!


Amanda Czerniawski, professora de Sociologia na Universidade de Temple, retomando o The Beauty Myth de Naomi Wolf ajuda-nos a não esquecer que, para as mulheres, sobretudo para as mais jovens, o corpo continua a ser uma prisão cujas grades elas próprias fabricam.

As imagens mediáticas e os ícones da moda são construções cujo objetivo é distorcer o nosso sentido acerca do que é um corpo normal; as dimensões das barbies que por aí andam não são normais nem representam mulheres normais mas cumprem às maravilhas o objetivo de colocar as mulheres normais numa situação de desconforto com a sua imagem, levando-as a utilizarem os mais extravagantes recursos, desde dietas rigorosas até cirúrgias estéticas perigosas e invasivas, para se aproximarem do ideal que lhes é proposto.
Por este meio insidioso as mulheres sujeitam-se a si mesmas, vigiando e disciplinando os seus próprios corpos, ao mesmo tempo que julgam estar a exercer a sua liberdade de escolha quando de facto continuam a perseguir o velho mito que ensina que o seu estatuto e a sua posição social dependem do corpo e da aparência física.

domingo, 11 de março de 2012

A alma do zigoto

No século IV, no Concílio de Niceia, discutiu-se com “seriedade” e “pureza de intenções” a questão de saber se as mulheres tinham alma. No século XXI, em círculos religiosos, e ultimamente também em círculos políticos dos Estados Unidos, discute-se com igual “seriedade” e igual “pureza de intenções” a questão de saber se o zigoto tem alma. Quem discutia e discute são obviamente homens e ninguém levanta a questão do conflito de interesses, até porque nos nossos dias algumas mulheres fazem a fineza de concordar com eles dando força e respeitabilidade às suas decisões.

As almas - presume-se - são iguais perante O Todo-Poderoso que, por acaso, e é só por acaso, também é pensado à imagem do homem; têm todas igual valor e não se pode sacrificar uma em benefício de outra, se tal acontecesse o Todo-Poderoso ficaria muito ressentido. Claro que nisto da igualdade das almas continuo com a estranha sensação de que me estão a engrupir e que afinal deve haver algumas almas mais iguais do que outras, mas essas devem ser de homens e quem sou eu para me meter no assunto?!

Para além deste paralelismo de temas, há outras analogias entre o passado e o presente, e essas vão no sentido de indicar que a ”pureza de intenções” tem exatamente o mesmo conteúdo e a mesma substância que é o de colocar as mulheres no lugar que Deus e a Natureza lhes reservaram, num lugar em que a sua liberdade e poder para tomarem em mãos a própria vida é severamente limitado.

Esta questão da alma, o que quer que ela seja, e tenho a convicção de que é apenas um termo forte dotado de uma aura de absoluto para referir uma realidade fraca e relativa - a inteligência - é de extrema importância. Eu não sei como acabou a história do Concílio de Niceia mas suspeito que o resultado deve ter sido inconclusivo a avaliar pelo modo como as mulheres continuaram a ser tratadas. Também não deve ser fácil concluir acerca da alma do zigoto; mas é bom reparar que com o levantamento destas questões conseguiu-se o que à partida se queria: instalar a dúvida em muito boa gente que deverá agir em conformidade, estou a falar de legisladores, conselheiros de bioética e homens e mulheres em geral.

Se as mulheres não têm alma então verdadeiramente não são pessoas; se o zigoto tem alma então verdadeiramente o zigoto é uma pessoa. Como estamos na dúvida, vamos agir com cautela e não permitir que uma eventual alma sacrifique outra eventual alma porque afinal as almas são iguais e têm todas o mesmo valor; claro que o zigoto, não pode fazer nada à eventual alma da mulher, mas os seus procuradores podem.

Não se julgue que falar especificamente em alma, em vez de falar em inteligência, não é relevante; tem várias e assinaláveis vantagens para as tais pessoas de intenções piedosas. A alma é um termo de conotação religiosa, refere uma entidade distinta do corpo., uma entidade que lhe sobrevive. Além disso, os direitos das almas serão iguais - não se pode falar em mais e menos alma.

Falar em alma coloca a questão num campo muito favorável a quem pretende atingir o objetivo, à partida pouco digno, de limitar a liberdade de ação das mulheres; tem de se encontrar uma boa razão para tal malfeitoria e a alma serve às maravilhas essa função; se falássemos em inteligência, desejos aspirações, projetos, sentimentos, logo veríamos que não há qualquer semelhança entre os direitos da mulher e os direitos do zigoto; por isso é que é tão importante manter a terminologia e a respetiva semântica. E enquanto não se abandonar este território minado qualquer tipo de argumentação que tente defender que afinal há circunstâncias em que é preciso sacrificar o zigoto para conferir dignidade á mulher está votada ao fracasso. Os amigos do zigoto e inimigos das mulheres vão sempre conseguir rebater tal argumentação, a derrota da mulher e a vitória do zigoto estarão asseguradas.

sábado, 3 de março de 2012

Dificultar a contracepção também dá jeito!!!

O Senado norte-americano conseguiu rejeitar recentemente, por uma margem mínima de 51/48 votos, a aprovação de legislação cujo objetivo era dificultar extremamente a aquisição de fármacos anticoncepcionais.
É altura de percebermos claramente que a direita norte-americana não se satisfaz com a restrição do recurso ao aborto, fazendo passar legislação que obriga qualquer mulher que solicita um aborto legalmente enquadrado a submeter-se a um exame de ultra-som - numa perfeita manobra dissuasora. A direita vai mais longe e pretende mesmo pôr em causa um direito de saúde reprodutiva que as mulheres já davam por adquirido: o direito a controlarem a sua capacidade reprodutiva.
A direita há muito percebeu que o melhor meio de manter um sistema iníquo, em que as mulheres se encontram numa posição de dependência e de inferioridade em relação aos homens, é limitar a sua liberdade e as sua possibilidade de escolha no campo reprodutivo, não permitindo que se autodeterminem e tomem em mãos as suas próprias vidas; daí todo este encarniçamento contra o aborto e agora também, imagine-se, contra o controlo dos nascimentos. A vida humana é apenas mais uma capa e um simulacro hipócrita para alcançarem propósitos que deixou de ser politicamente correto revelar.
O que se está a passar nos Estados Unidos deveria alertar-nos para o que pode vir a acontecer na Europa e em outras partes do mundo; a luta é sempre a mesma, uma luta em que a reação não desiste em controlar a vida do indivíduo comum, procurando regressar nostalgicamente a um passado que julgávamos já enterrado.
O que se está a passar também deveria levar as mulheres a questionarem o que verdadeiramente se pretende quando se apela para valores morais, como o direito à vida, para lhes limitar a própria vida; infelizmente muitas mulheres, neste como em outros domínios, sofreram uma autêntica lavagem cerebral, são facilmente manipuladas e não percebem que enquanto não controlarem a sua sexualidade não serão verdadeiramente livres.
Quando se fala em direita tende a pensar-se em partidos políticos, mas será melhor começarmos a perceber que a direita política só consegue progredir nos seus intentos porque conta com uma direita social e com uma mentalidade em que, apesar de tudo, valores hipócritas e interesses inconfessáveis disfarçados se encontram acantonados. Curiosamente essa direita social é bem mais ampla do que a direita política e ingénuamente acaba por servir os interesses desta.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Transformar sexo em trabalho


O tema que vou abordar foi-me sugerido por um programa de televisão a que assisti ontem que tratava da prostituição e falava eufemisticamente em trabalhadoras de sexo e por um anúncio televisivo que procurava promover o uso de preservativos pelos utentes das ‘trabalhadoras’ de sexo. Dada a naturalidade com que o assunto era encarado, pareceu-me que os dois itens televisivos tentavam mais uma vez normalizar a prostituição, o que me parece profundamente errado.

A preocupação em normalizar a prostituição é antiga, médicos, sociólogos e sexólogos tem retomado a questão em diferentes épocas, por exemplo, ainda em meados do século XX, eminentes sexólogos como Benjamin e Masters (1965) consideraram a prostituição como um serviço destinado a satisfazer as necessidades sexuais dos homens.

Os liberais dos nossos dias, cooptando conceitos subversivos como consciência, consentimento e liberdade, defendem que a não legalização da prostituição é um atentado aos direitos humanos, nomeadamente o direito à livre escolha, e rotulam de moralistas todas as pessoas que não concordam com eles neste particular domínio. Mas a hipocrisia desta posição fica bem patente quando lembramos que de uma maneira geral a prostituição decorre, por um lado, da vulnerabilidade de jovens e de mulheres e por outro da superioridade de poder dos homens. As pessoas pobres são particularmente vulneráveis à exploração e dificilmente se pode falar em escolha quando não há reais opções de sobrevivência e quando, ainda por cima, se pretende conferir uma aura de «dignidade» a uma ‘escolha’ intrinsecamente indigna. O mito da escolha exerce função idêntica à de outros mitos culturais que escondem o que se encontra por detrás da realidade, que mistificam a realidade para a tornar aceitável.

O liberalismo clássico, com a teoria do contrato, constitui o suporte filosófico do movimento que defende a legalização da prostituição; mas é bom não esquecer que o liberalismo clássico também, in illo tempore, tentou preservar a submissão das mulheres ao poder masculino, argumentando que pelo contrato de casamento a mulher abdicava voluntariamente do direito a dispor dos seus bens ou a escolher os seus representantes no poder político, pois transferia livremente e por consentimento esses direitos para o marido. Entender a prostituição como contrato entre a prostituta e o cliente incorre exactamente no mesmo vício de raciocinio: a mulher transfere para o homem, a troco de dinheiro, o direito de dispor livremente da sua pessoa na atividade sexual; desse modo é institucionalizada a redução das mulheres a objectos sexuais.

Em minha opinião, legalizar a prostituição é dizer que está certo tratar as mulheres como objectos, como mercadorias que podem ser adquiridas mediante quantias previamente estipuladas. Entender a prostituição como um contrato entre pessoas é despolitizar a prostituição e escamotear que ela é antes de mais e acima de tudo uma questão de poder e uma questão de exploração dos mais fracos pelos mais fortes.

Argumenta-se ainda que a prostituta não se vende como pessoa, vende apenas o seu corpo; mas no Contrato Sexual (1988) a cientista política Carole Pateman, chamou a atenção para o fato de que o sexo do indivíduo não pode ser separado da sua personalidade; isto para dizer que o corpo não é um objecto neutral que se pode separar do «eu» porque o «eu» é sempre um corpo de pensa, sente, deseja; quando a prostituta vende o corpo ela vende algo que é intrínseco à sua identidade e ao seu eu.

Alguns ainda tem o desplante de argumentar que as prostitutas são mulheres que apreciam o sexo e não têm quaisquer preconceitos em relação à atividade sexual; outros vão mesmo ao cúmulo de apresentar a prostituição como paradigma da libertação sexual das mulheres. Mas então porque é que não vemos mulheres ricas, cultas e instruídas dedicarem-se a uma atividade tão libertadora e enriquecedora?

Eu não ataco a prostituição por considerar que as prostitutas ameaçam a família, enquanto valor social, nem penso que as prostitutas devam ser criminalizadas e punidas; bem pelo contrário, concordo com a legislação sueca que criminaliza e considera ofensor o homem que prostitui a mulher. Entendo a prostituição como uma forma extrema de violência e de exploração sexual que se quer mascarar a troco do dinheiro recebido pela prostituta e com o argumento de que ela é adulta e dá o seu consentimento. Entendo que legalizar a prostituição é proteger os direitos sexuais dos homens à custa dos direitos das mulheres, nomeadamente do direito à autonomia sexual e constitui um severo atentado à saúde das mulheres e ao seu bem-estar enquanto pessoas.

Em vez de se lutar pela legalização da prostituição com o argumento de que as prostitutas sairiam beneficiadas, seria desejável que se começasse a refletir sobre a natureza deste ‘trabalho’ e a pensar a sério em eliminar as condições que levam as mulheres a ‘escolhê-lo». Legalizar a prostituição é legalizar a violência sexual, é aceitar a escravatura sexual e a seguir ficar de consciência limpa e de mãos amarradas. É manter invisíveis os danos que a prática da prostituição provoca nas mulheres.

No livro Making Sex Work, Janice Raymond, resume bem a situação: É a troca por dinheiro que permite transformar aquilo que de fato a prostituição é: assédio sexual, abuso sexual e violência sexual , num ‘trabalho’ conhecido como ‘trabalho do sexo comercial’. Um ‘trabalho’ realizado basicamente por mulheres racial e economicamente desfavorecidas e por um enorme número de mulheres e de crianças que foram vítimas na infância de abuso sexual.”

Àqueles que são a favor da legalização da prostituição, que consideram as prostitutas ‘trabalhadoras’ do sexo, que não veem nada de mais nesse tipo de trabalho - um como qualquer outro – pergunto porque é que não extraem as consequências lógicas desse ponto de vista e não estimulam as suas filhas, irmãs, mães ou até mesmo esposas, a seguirem a carreira?

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Homossexuais e baixo estatuto social

Não é por acaso que quando a mídia aceita apresentar homossexuais, particularmente em novelas ou seriados televisivos, «escolhe» personagens que evidenciam, muitas vezes de forma exagerada e ridícula, características femininas, seja através da postura, do modo de falar ou comportamento, pois assim eles são socialmente «aceitáveis». Toda a gente sabe que há muitos homossexuais, provavelmente a maioria, que não se enquadram neste estereótipo, mas esses nunca aparecem.

Esta é uma maneira de diminuir o status dos homossexuais – apresentá-los como femininos é desvalorizá-los porque também sabemos que o estatuto das mulheres ainda hoje é percebido como inferior ao dos homens. Isto acontece porque os homossexuais põem em causa a identidade masculina, tal como ela tem sido construída, e o grupo dos homens, sentindo-se ameaçado, encontra neles o bode expiatório que pode ser punido e para não punir homens opta por punir «mulheres».
Um homem feminino, embora objecto de medo, é ridicularizado, fingindo-se que não vale a pena temê-lo porque afinal é uma mulher, não é verdadeiramente um homem. Em contrapartida, uma mulher masculina, ao assumir traços que são valorizados socialmente, embora temida e execrada, não é tão frequentemente ridicularizada, ao invés do ridículo, para ela, recorre-se pura e simplesmente ao insulto torpe.

O excerto que a seguir transcrevo chama a nossa atenção para estes aspectos, nem sempre compreendidos quando se faz uma leitura superficial da situação:

“ Uma das razões por que os homossexuais perdem em estatuto é porque são percebidos como femininos, e como sabemos as mulheres enquanto classe gozam de um prestígio relativamente baixo. Além disso, ‘as ovelhas negras’ – membros de um grupo que, por se desviarem das normas do grupo, ameaçam o sentido de status ou de identidade de todo o grupo – podem ser especificamente vilipendiados. … por contraste, as mulheres podem sentir orgulho nos atributos masculinos porque estes favorecem o seu status natural.”
(Laurie A. Rudman and Peter Glick: The Social Psychology of Gender)

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Para as mulheres, a melhor maneira de subir continua a ser na horizontal

A Itália é um dos países europeus com piores índices no que concerne à igualdade de género e as italianas pensam que Berlusconi não é alheio a esse fenómeno. Antes de ser primeiro-ministro, dirigiu durante décadas um poderoso império no domínio da comunicação social, com a ajuda do qual se fez eleger, e teve oportunidade de moldar a imagem da mulher que considerava aceitável: jovem, bela, fútil e ávida de ser tratada como objecto sexual. Depois de se transformar em político, bem, depois é o que se vê com escândalos atrás de escândalos que envolvem relacionamentos com jovens, algumas menores de idade.
Berlusconi continua a enviar às jovens mulheres a mensagem de que o caminho mais fácil para se darem bem é serem acompanhantes de homens ricos e politicamente influentes. Hoje, ser garota de programa é um meio glamoroso de garantir rápida ascensão social. Berlusconi aliás sempre procurou atenuar a linha entre show business e política ao escolher candidatas a cargos políticos de entre as protagonistas dos seus programas televisivos. Mara Carfagna, ex show girl e modelo topless, é ministra do seu gabinete para a questão da igualdade de oportunidades, as outras quatro são praticamente desconhecidas, inócuas e inoperantes politicamente, uma espécie de verbo de encher ... para inglês ver.
Com Berlusconi as mulheres podem ter a certeza de que o melhor meio de subirem ainda é na horizontal, desde que sejam jovens, belas e disponíveis.

domingo, 31 de maio de 2009

Os perigos da legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo!!

No dia em que nos Estados Unidos o Maine se tornou o 5º Estado a legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, o televangélico Pat Robertson reagiu produzindo a espantosa afirmação de que tal levará à legalização da poligamia, da bestialidade e da pedofilia. Será que o homem está bom do juízo? Como se pode ser tão bronco? Ou será apenas má fé?Aqui está o que ele disse sobre o assunto:
ROBERTSON: Lee, we haven’t taken this to its ultimate conclusion. You got polygamy out there. How can we rule that polygamy is illegal when you say that homosexual marriage is legal. What is it about polygamy that’s different? Well, polygamy was outlawed because it was considered immoral according to biblical standards. But if we take biblical standards away in homosexuality, what about the other? And what about bestiality and ultimately what about child molestation and pedophilia? How can we criminalize these things and at the same time have constitutional amendments allowing same-sex marriage among homosexuals. You mark my words, this is just the beginning in a long downward slide in relation to all the things that we consider to be abhorrent.»
A legislação contra a poligamia, a pedofilia e a bestialidade não precisa de recorrer à bíblia para encontrar o seu fundamento; confundir as questões pode dar jeito, mas nem por isso deixa de ser uma confusão.

Todavia, mais do que contrapor argumentos, nada é melhor do que o humor e a ironia desta dupla imparável para cobrir de ridículo personagens deste jaez:

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Fanatismo e sexo ou quando o diabo anda à solta

Os iraquianos aprenderam uma nova forma de tortura para castigar e matar homossexuais. A denúncia recente foi feita por Yina Mohammad, activista dos direitos humanos.
Milícias xiitas utilizam uma substância química tipo cola só removível cirurgicamente para obstruir completamente o ânus das vítimas que em seguida são obrigadas a ingerir uma bebida que provoca diarreia. O resultado é uma morte lenta e um sofrimento indescritível.
Este é o Iraque democrático que Bush prometeu: uma mistura satânica de fanatismo, sexo e violência em doses inimagináveis.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Quando a homofobia começa na escola

Jaheem Herrera, 11 anos, enforcou-se após ter sido continuadamente enxovalhado e escarnecido na escola que frequentava, sob a alegação de que seria gay. Mais uma vítima mortal, este mês a segunda e pelo mesmo motivo, da prática do bullying, muito vulgarizada em escolas dos Estados Unidos e vista com alguma complacência (as rapaziadas do costume!) pelas autoridades de muitas instituições.
Independentemente desta suspeita de comportamento ou tendência homossexual ter ou não fundamento, a mensagem que este tipo de perseguição envia é a de que aquele que não se comporta de acordo com o estereótipo de masculinidade considerado desejável irá ter problemas.
Para Jaheem Herrera os problemas terminaram a 17 de Abril de 2009; os seus colegas encarregaram-se de dar uma ajuda. Alguém me diz o que é que os pais ensinaram a estes rapazinhos??