sábado, 25 de junho de 2011

“É Preciso Queimar Sade?”


Faut-il Bruler Sade? é o título de uma obra publicada por Simone de Beauvoir em 1951. Sendo Beauvoir uma feminista e Sade um homem que procurou ‘humilhar’ as mulheres através de práticas sexuais de dominação e que deixou testemunho escrito dessas práticas, ficamos um pouco surpreendidas já que a resposta dada à pergunta é decididamente negativa. Se soubermos ainda que o próprio filho do escritor, numa manifestação de repúdio, queimou uma obra do pai e que Albert Camus, contemporâneo de Beauvoir, rejeitou Sade considerando que nele se encontra o fermento do fascismo, ao fazer em pleno século XVIII a apologia de uma sociedade totalitária, a perplexidade aumenta; mas o propósito de Beauvoir é aceitar o desafio de refletir sobre o que se encontra implicado na obra e vida de Sade, na pressuposição de que o que ele escreve é reflexo de experiências vividas. Assim, 'não queimar Sade' não é aceitar as suas ideias nem é isso que Beauvoir vai fazer, é procurar aprender alguma coisa com elas, sobretudo se atendermos a quão perturbadoras são.
Sade tratou mulheres com crueldade extrema, infligindo-lhes dor física escrupulosamente premeditada; nunca considerou qualquer hipótese de reciprocidade na relação sexual e levou a uma forma extrema o modelo sexual do domínio/submissão, através de atos explícitos de violência masculina e de submissão feminina. Nele, aquilo que viria a ser conhecido pela expressão sado-masoquismo encontrou um lídimo representante. Não sendo de modo nenhum um modelo a seguir, refletir sobre Sade, em certo sentido, é refletir sobre a sexualidade humana; é perguntar-se, como Jen-Paul Sartre virá dois séculos depois a fazer, se é possível um indivíduo afirmar-se, através do sexo e do domínio sobre o corpo, como soberano absoluto perante o Outro.

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