2 - Sexualidade e ética
Estabelecida a distinção entre sexo
e sexualidade, no texto anteriormente publicado, cumpre agora chamar a atenção
para a dimensão ética da sexualidade, o que significa dizer que ela não é
neutra em relação a valores de bem e de mal, que é suscetível de avaliação
ética.
A sexualidade, sempre que implique
relação interpessoal, (e há casos em que isso não acontece, estou a pensar, por
exemplo, na masturbação), supõe a preocupação com o próprio e com o outro,
enquanto pessoas que se devem respeito recíproco. O sexo, na medida em que
implica entrar em relação com o outro, como qualquer atividade interpessoal,
não pode ignorar os legítimos interesses deste, isto é os seus direitos,
simétricos dos nossos. As pessoas são agentes racionais capazes de se
auto-determinarem livremente e, por isso, tem uma dignidade que os objetos não
revestem. Decorrem daqui certas condições que a sexualidade humana pressupõe:
(1) Desde logo o consentimento: não
é eticamente aceitável uma relação sexual em que uma das partes não consinta.
Hoje defende-se mesmo que o consentimento não deve ser presumido pelo facto de
a mulher não dizer “não”, ela tem de ser afirmativa e não apenas reativa.
(2) Um outro aspeto tem a ver com
certas formas de coerção exercidas sub-repticiamente pelo parceiro sexual com o
objetivo de “obrigar” a companheira a alinhar em práticas sexuais em que ela se
sente desconfortável e que só aceita para lhe ser agradável, ou para não
parecer antiquada ou puritana. (estou a pensar no sexo anal que foi objeto de
um estudo recente que revelou níveis preocupantes de coerção na população
adolescente feminina).
(3) Por último, mas não menos
importante, o princípio da reciprocidade deve ser sempre reconhecido e estar
sempre presente; apenas para dar um exemplo dessa reciprocidade, lembremos que
o sexo oral não pode ser entendido como “feito” pela mulher ao homem. Parafraseando Linda LeMonchek, que
não queria discutir o dualismo cartesiano na cama, ninguém quer discutir
reciprocidade na cama, mas não pode sentir, nem de perto nem de longe, que ela
está em falta, porque, se isso acontecer, pura e simplesmente não alinha, ou
não deve alinhar.
Em síntese, podemos dizer que o
respeito pelas pessoas tem de estar implícito na relação sexual. Mas temos de
lembrar que a pornografia por um lado e a prostituição por outro dificultam a
interiorização deste princípio e, infelizmente, são essas as duas vias através
das quais os jovens aprendem a sexualidade que depois ensinam às companheiras.
Prostituição e pornografia
objetificam a mulher e promovem e divulgam estereótipos de papeis sexuais que a
desvalorizam enquanto pessoa. Ora, sendo a sexualidade aprendida
fundamentalmente por estes dois meios, temos todos os motivos para recear que ela continue a ser um instrumento para manter o statu quo e a
assimetria de género.
A revolução sexual não consiste
apenas nem principalmente na maior liberdade das mulheres para se entregarem a
atividades sexuais, embora este aspeto seja importante. Em certo sentido, e
numa apreciação um tanto cínica, poderíamos dizer que esse tipo de revolução
interessa sobretudo aos homens porque assim encontram um maior número de
mulheres disponíveis. A verdadeira revolução sexual só será alcançada quando
houver real capacidade de autodeterminação sexual tanto de mulheres como de
homens e esta está decididamente por fazer.
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