sexta-feira, 4 de junho de 2010

O feminismo da diferença e seus riscos

O feminismo não é de modo algum monolítico, existem tendências diversas, mas parece legítimo defender que aquelas tendências que insistem na diferença entre os sexos e que referem modos de conhecer ou de agir moral especificamente femininos constituem uma faca de dois gumes pois, embora pareçam conceder às mulheres uma superioridade, continuam a repetir a velha tecla que insistia na superioridade moral das mulheres, abnegadas e dotadas e espírito de sacrifício, mas continuava a relegá-las para uma posição social inferior de subordinação aos homens.

Numa fase em que a igualdade de direitos era pura utopia, em que era negado às mulheres acesso à esfera pública, até se percebe que elas lutassem com as armas que tinham à sua disposição e insistissem em diferenças que aparentemente as «superiorizavam» e lhes conferiam poder; percebe-se que reivindicassem, por exemplo, acesso à educação com o argumento de que assim se tornariam melhores mães e esposas; mas, hoje, encontramo-nos noutro patamar de exigências e parece menos acautelado voltar a insistir numa tecla que pode justificar o estabelecimento de desigualdades legais ou outras nos diversos domínios em que decorre a vida de mulheres e homens, até porque, como a diferença foi constituída em termos de hierarquia, com a insistência na diferença corre-se o risco de perpetuar a hierarquia.

Por tudo isto, fico sempre preocupada quando vejo mulheres a tentarem mostrar quão melhores são do que os homens, mais preocupadas com os outros, mais protectoras, dadoras de vida e de amor, porque lembro sempre o velho slogan, tão ao gosto de uma certa elite conservadora, que não cansa de apostar na complementaridade dos sexos com mulheres maternais e homens inteligentes, omitindo sempre que o que de facto valoriza é a inteligência e não a maternidade - aquela a mais alta manifestação do espírito humano, esta uma função biológica que muitos mamíferos também desempenham exemplarmente.

1 comentário:

  1. oi adília,
    não acho que feminismos da diferença sejam primariamente sobre mulheres insistindo que são melhores que os homens.

    para mim, feministas como luce irigaray, rosi braidotti e até mesmo audre lorde estão defendendo o argumento poderoso de que diferenças não podem ser hierarquizadas. que hierarquia é já um sinal de falta de diferença, porque significa que estamos usando um padrão xis para avaliar todas as coisas. como irigaray diria, estamos definindo a feminilidade (seja lá o que ela for) em função de uma masculinidade (mesma coisa). e o que importa é quebrar esse padrão...

    acho que o feminismo da diferença tem seus riscos, sim. e pra mim o principal deles é estabelecer uma diferença homem/mulher que acredite que o conjunto de mulheres é homogêneo, ou seja que a diferença só está entre os dois grupos e não dentro do próprio grupo...

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