O feminismo não é de modo algum monolítico, existem tendências diversas, mas parece legítimo defender que aquelas tendências que insistem na diferença entre os sexos e que referem modos de conhecer ou de agir moral especificamente femininos constituem uma faca de dois gumes pois, embora pareçam conceder às mulheres uma superioridade, continuam a repetir a velha tecla que insistia na superioridade moral das mulheres, abnegadas e dotadas e espírito de sacrifício, mas continuava a relegá-las para uma posição social inferior de subordinação aos homens.
Numa fase em que a igualdade de direitos era pura utopia, em que era negado às mulheres acesso à esfera pública, até se percebe que elas lutassem com as armas que tinham à sua disposição e insistissem em diferenças que aparentemente as «superiorizavam» e lhes conferiam poder; percebe-se que reivindicassem, por exemplo, acesso à educação com o argumento de que assim se tornariam melhores mães e esposas; mas, hoje, encontramo-nos noutro patamar de exigências e parece menos acautelado voltar a insistir numa tecla que pode justificar o estabelecimento de desigualdades legais ou outras nos diversos domínios em que decorre a vida de mulheres e homens, até porque, como a diferença foi constituída em termos de hierarquia, com a insistência na diferença corre-se o risco de perpetuar a hierarquia.
Por tudo isto, fico sempre preocupada quando vejo mulheres a tentarem mostrar quão melhores são do que os homens, mais preocupadas com os outros, mais protectoras, dadoras de vida e de amor, porque lembro sempre o velho slogan, tão ao gosto de uma certa elite conservadora, que não cansa de apostar na complementaridade dos sexos com mulheres maternais e homens inteligentes, omitindo sempre que o que de facto valoriza é a inteligência e não a maternidade - aquela a mais alta manifestação do espírito humano, esta uma função biológica que muitos mamíferos também desempenham exemplarmente.
oi adília,
ResponderEliminarnão acho que feminismos da diferença sejam primariamente sobre mulheres insistindo que são melhores que os homens.
para mim, feministas como luce irigaray, rosi braidotti e até mesmo audre lorde estão defendendo o argumento poderoso de que diferenças não podem ser hierarquizadas. que hierarquia é já um sinal de falta de diferença, porque significa que estamos usando um padrão xis para avaliar todas as coisas. como irigaray diria, estamos definindo a feminilidade (seja lá o que ela for) em função de uma masculinidade (mesma coisa). e o que importa é quebrar esse padrão...
acho que o feminismo da diferença tem seus riscos, sim. e pra mim o principal deles é estabelecer uma diferença homem/mulher que acredite que o conjunto de mulheres é homogêneo, ou seja que a diferença só está entre os dois grupos e não dentro do próprio grupo...