Aristóteles disse: «(a escravatura) é a condição de todos aqueles cuja função é mero serviço físico e que são incapazes de outra coisa melhor; esses são escravos naturais.»
No século XIX, havia um entendimento bastante amplo de que a função da mulher se reduzia à preservação da espécie e à criação dos filhos e cuidados com o lar; era esse entendimento que justificava que lhe fosse completamente vedado o acesso à participação na vida política, esta, dizia-se, não era a sua esfera - nem Deus nem a natureza a tinham capacitado para essas funções.
Não é necessária grande reflexão para se perceber que deste modo se transformavam as mulheres em autênticas servas domésticas, escravas naturais, como diria Aristóteles. Pessoas apenas capazes de serviço físico, serviço físico para preservar a espécie e serviço físico para prestar os concomitantes cuidados. Participar na vida pública, contribuir para a tomada de decisões que interessavam à sociedade, desenvolver-se enquanto ser livre e autónomo, isso estava completamente fora de cogitação
Em troca do serviço prestado, as mulheres recebiam comida, vestuário, abrigo e protecção, tal como os escravos. É certo que umas viviam em gaiolas douradas, outras em casebres, mas o estatuto não se alterava significativamente. Num caso ou no outro, não podiam abandonar os seus senhores – não podiam abandonar o domicílio conjugal nem requerer divórcio, esse direito era restringido aos maridos; os filhos que geravam eram propriedade dos maridos; não tinham o direito de propriedade nem mesmo sobre os bens que traziam para o casamento e se trabalhassem fora de casa, o salário pertencia ao marido que o podia administrar a seu bel-prazer. E isto ocorria não faz assim tanto tempo!
Hoje, em muitos países, as coisas são diferentes, mas mesmo assim ainda há mulheres que abdicam da sua participação na vida social e política para se colocarem na dependência dos maridos, esquecendo que afinal estão a seguir um padrão antiquíssimo que implica um enorme risco: o risco de sacrificarem a sua liberdade e de comprometerem a sua autonomia.
Claro que a escravatura das mulheres, pelo menos em tempos mais recentes, era atenuada por um tratamento mais humano do que aquele que normalmente era dispensado aos escravos tradicionais, mas isso não modifica substancialmente a situação e o facto desta não ser reconhecida como escravatura também não a altera, porque, realmente, que outro nome podemos dar a pessoas que não gozavam nem de direitos civis nem de direitos políticos e às quais era exigida subserviência e submissão?
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