domingo, 26 de setembro de 2010

Ruth Whitney Lyman - quem são as anti-sufragistas

Ruth Whitney Lyman escreveu um ensaio sobre o ideal anti-sufragista mas, muito de acordo com os princípios que defende, decidiu apagar-se como pessoa, pois assina como Mrs. Herbert Lyman, autenticamente um apêndice do sr. Herbert Lyman, seu esposo. Vejamos o que nos diz acerca das diferenças entre as sufragistas e as anti-sufragistas:

“A diferença fundamental é esta: as sufragistas (como os socialistas) insistem em considerar o indivíduo como a unidade da sociedade enquanto as anti-sufragistas insistem em que esta é a família. O individualismo é o que é importante para as sufragistas, para as anti-sufragistas é a solidez das relações familiares. O sufragismo está baseado na consciência de sexo do indivíduo e no antagonismo entre os sexos, o que conduz à afirmação de que a mulher pode apenas ser representada por ela própria e que as mulheres neste momento são uma classe não representada. Mas de facto as mulheres não são uma classe, mas um sexo, perfeitamente distribuído pelas várias classes sociais.
O anti-sufragismo está fundado na concepção da cooperação entre os sexos. Homens e mulheres devem ser considerados como sócios, não competidores, e a família a ser preservada como uma unidade, deve ser representada como tendo uma cabeça política. O homem da família deve ser quem representa, porque o governo é primariamente para garantir a protecção da vida e da propriedade e repousa na força política da maioria que deve ser capaz de, em caso de necessidade, forçar as minorias a obedecer à sua vontade. Esta é a única base na qual uma democracia pode perdurar.” (Mrs Herbert Lyman: The Anti-suffrage Ideal, in Ernest Bernbaum; Anti-suffrage Essays, p. 119)

Como se pode constatar a tónica é colocada entre o indivíduo e a família, entre o individualismo e a «solidez das relações familiares. As anti-sufragistas valorizam sempre a família, mesmo quando esta implica o sacrifício do indivíduo mulher, porque o homem, na relação familiar, não é minimamente beliscado enquanto indivíduo.
Para que o homem mantenha, na família, o status de individuo autónomo que sempre tem tido, é preciso que a mulher se anule como pessoa, porque uma pessoa - e aqui estou a seguir Kant - é um fim em si mesmo e não um meio ao serviço de um qualquer outro fim. Só numa união familiar que respeite os indivíduos é que a personalidade ética de mulheres e de homens se encontra assegurada, mesmo que isso represente compromissos e abdicações de parte a parte.

Para as anti-sufragistas as mulheres não são uma classe e por isso não há necessidade de que tenham representação política e desse modo consideram que um regime não deixaria de ser democrático por esse facto; mas temos de ver o que caracteriza uma classe e se entendermos que essa caracterização implica a existência de interesses comuns que têm de ser acautelados, então as mulheres constituem, pelo menos por enquanto, uma classe, embora, dados os condicionalismos da sua existência, uma classe que se encontra fragmentada por outras classes sociais e por isso é que a luta tem sido tão difícil.
As anti-sufragistas acusam as sufragistas de estabelecerem uma relação de hostilidade com os homens, o que em parte é falso e em parte é mistificador. Antes de mais, muitas sufragistas, por exemplo, mantiveram casamentos sólidos e felizes, embora algumas tenham reescrito os votos de casamento para anularem as tradicionais cláusulas da obediência feminina. Por outro, a hostilidade surge sobretudo por parte de alguns homens que entendem não dever abdicar do seu estatuto de superioridade. Portanto há aqui um equívoco, não são as sufragistas que são hostis, são alguns, muitos homens, que são hostis a mulheres que exigem o que eles não reconhecem como direitos.
As anti-sufragistas defendem não apenas a família mas sobretudo a família patriarcal, na qual a figura do chefe de família permite a eliminação do voto para as mulheres pois obviamente se elas votassem apenas iriam duplicar o voto masculino. Entendem que o destino da mulher é casar, a «solteirona» é percebida como uma aberração da natureza. Além de que, se num governo é preciso força para fazer cumprir as leis e se só o homem é forte só ele deve governar, mas isto é esquecer a diferença que há entre força e direito e sem essa diferença nem precisávamos de ter evoluído para as formas modernas de governação, ainda devíamos estar na idade da pedra lascada e recorrer apenas ao cacete para dirimir os conflitos.
Mas se aceitarmos que as mulheres são pessoas, então elas, porque são pessoas diferentes dos homens em alguns aspectos, devem estar igualmente representadas nos órgãos de legislação e de decisão política e, por isso, o voto e a participação em cargos políticos são aspectos essenciais, contrariamente ao que pensam as anti-sufragistas.

Resumindo: (1) as anti-sufragistas não reconhecem que as mulheres são pessoas e consequentemente (2) não consideram necessário que elas tenham voz na governação do país; afirmam ainda (3) que elas não constituem uma classe e, por isso, o facto de não estarem representadas politicamente não retira democraticidade a um regime político.

Se você não se considera uma pessoa, então esteja à vontade, alinhe com as anti-feministas de hoje que são as lídimas representantes das anti-sufragistas de ontem.

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