quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

«The New Woman»

Nos finais do século XIX e inícios do século XX, o movimento feminista conheceu um momento de grande optimismo e fé num futuro que finalmente haveria de trazer liberdade e igualdade para as mulheres. O objectivo do movimento era a conquista do direito de voto e este era entendido como um instrumento que iria permitir modificar os arranjos sociais existentes que, particularmente através da instituição do casamento, se revelavam extremamente limitativos para a autonomia das mulheres.

O feminismo parecia estar na ordem do dia; mas o contra-ataque não se fez esperar. Desde logo surgiram inúmeros artigos publicados por médicos, psicólogos, sociólogos e outras autoridades cujo objectivo, devidamente camuflado sob a capa da descrição objectiva que a ciência permitiria, era o de persuadir as mulheres de que deveriam limitar-se ao desempenho do papel que Deus e a biologia para elas tinham reservado.

Intelectuais aparentemente progressistas, como por exemplo E. Belfort Bax, juntavam-se ao coro, manifestando abertamente sentimentos anti-feministas e fazendo campanha declarada contra o feminismo. O livro de Belfort Bax então publicado The Fraud of Feminism, não deixa lugar a dúvidas, o objectivo declarado pelo autor no prefácio é «contestar o novo movimento feminista, denunciando as infamantes falsidades, as declarações convencionais que não são meras perversões da verdade, mas que são directa e categoricamente contrárias à verdade e que se mantém pelo simples facto de serem repetidas sem serem contraditadas.»

Belford Bax era apenas um dos muitos que «responderam com pessimismo ao nascimento dos tempos modernos, para os quais a emancipação das mulheres era central, experienciando-a acima de tudo como uma crise de identidade masculina.»[1]

O contra-ataque não foi apenas protagonizado por homens, também as mulheres se manifestaram em desfavor das pretensões feministas. Caso esclarecedor foi o da escritora Laura Marholm Hansson que exemplifica a estratégia e a retórica então utilizada. Apelando para a natureza feminina, glosando a «alma da mulher» utilizando com oportunidade expressões como «as verdadeiras mulheres» e «os reais interesses das mulheres», Marholm Hansson critica as pretensões intelectuais das «novas mulheres» - expressão usada sempre depreciativamente, defendendo que essa «intelectualidade estéril» não contribuía de modo nenhum para a sua realização.

A «Nova mulher», expressão designativa da mulher emancipada, era descrita e ridicularizada nos meios de comunicação social da época, jornais, revistas, cartoons. O retrato mostrava mulheres pouco ou nada atraentes fisicamente (lembremos que desde sempre a beleza era o atributo feminino mais valorizado), educadas (intelectuais); amantes dos desportos (símbolo da liberdade física), fumadoras (símbolo de emancipação nos costumes) e hostis ao casamento (destino que desde sempre era apresentado em exclusividade, e sem outra opção, para as mulheres). Numa palavra a «nova mulher» não era uma verdadeira mulher e deve reconhecer-se que este retrato não era favorável a que a maioria das mulheres se identificasse com as feministas, bem pelo contrário. É de supor que os cartoons que ridicularizavam as feministas, se aceitarmos o slogan de que uma imagem vale mais do que mil palavras, faziam estragos irreparáveis e duradouros. De facto foi isso que aconteceu e que ainda hoje se mantém.
[1] European feminisms, p. 183

3 comentários:

  1. Adília,

    Há que reconhecer que esta Nova Mulher arrasta uma sobrecarga de trabalho ainda não inteiramente compensada com a transformação das energias masculinas em energias femininas (o processo vai mais lento do que o oposto...)

    Excelente trabalho, Adília!

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  2. Claro que as coisas não estão fáceis, mas é preciso evitar andar para trás e por isso é que em minha opinião é importante conhecer os movimentos antifeministas que tem sido bastante descurados.
    Obrigada pela apreciação que manifesta sobre o meu trabalho. Vou continuar a estudar este tema e a dar notícia no blog.
    abraço adilia

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  3. Adília,

    Parece que me atrasei... (é crónico..., desculpe...)
    Ainda bem que lhe consegui transmitir o meu apreço.

    Ainda nos dias de hoje, não é fácil manter erguida uma bandeira como a sua... os ventos são traidores... e existe ainda um conservadorismo surpreendente oculto onde menos se espera.

    Por isso a aprecio, sim, vou passando sempre e agora vou ler o resto.

    Um abraço.

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