sexta-feira, 24 de abril de 2009

Da castidade enquanto virtude ou de como os tempos mudam

Divergir da corrente tradicional e considerar a castidade – virtude pretensamente feminina, como uma virtude artificial, como David Hume fez (1711-1766), não é de todo indiferente, nem é uma questão ociosa, como pode parecer à primeira vista.
Se a castidade é uma virtude artificial, inculcada nas mulheres como recurso, na altura aparentemente único, para assegurar aos maridos a paternidade dos filhos que entendem como seus, então a unilateralidade dessa virtude deixará de fazer sentido a partir do momento em que se encontrem outros meios de identificar a filiação, o que nos nossos dias se consegue através dos testes de determinação do ADN. A partir daqui, se se quiser manter unida a família tradicional, a castidade deixará de ser virtude feminina para passar a ser simplesmente virtude tão aconselhável à esposa quanto ao marido, pois de outra maneira, este pode vir a ter filhos fora do casamento que irão certamente perturbar os arranjos, nomeadamente os financeiros, do seu matrimónio.
Não foi por acaso que, durante séculos, mantendo um duplo padrão de conduta, os homens se aventuraram fora do casamento, mas de uma maneira geral sempre recusaram aceitar ou sequer reconhecer os «bastardos» - palavra que ainda hoje na língua inglesa corresponde a um insulto que visa não o «virtuoso» progenitor masculino mas a mãe, entendida como senhora de costumes pouco edificantes. Agora essa estratégia deixou de estar ao alcance e convém que os homens se mantenham atentos, se não quiserem criar responsabilidades para as quais podem não estar preparados e que abandonem o duplo padrão de conduta não mais justificável.

Por aqui se vê como afinal, contrariamente à opinião de muitos, a filosofia, com as suas conceptualizações aparentemente irrelevantes, é um tipo de reflexão de consequências práticas iniludíveis.

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